Olá, estimados orientistas!
Conforme combinado, vamos à análise de rotas do Percurso
Longo da II Etapa do CamBOr 2016. E já vale comentar com vocês as impressões
gerais sobre esta prova.
Em que pesem todos os elogios ao evento (organização,
amenidades, local escolhido, oferta de um Sprint Noturno), o primeiro dia de
orientação tradicional acabou por ser traumático para muitos participantes. Num
contexto geral, a principal reclamação foi corroborada pelos tempos finais em
diversas categorias. Explicando melhor, muitas rotas eram obrigatoriamente
desenvolvidas em locais de progressão lenta ou muito lenta. Um grande número de
competidores levou tempo maior que 1h30’ para cruzar o pórtico de chegada.
Em conversa com um dos organizadores da I Etapa, perguntei
sua opinião sobre o fato de muitos atletas levarem tempo muito superior ao
estimado para o vencedor de cada categoria. Ele me lembrou que nem todo o
competidor está focado no pódio. Muitos já têm como maior prêmio a satisfação
de completar o percurso sem erros. Tenho que concordar. Este é um dos aspectos
que torna nosso esporte tão espetacular.
Mas mesmo sob esta ótica, considero que a questão da
navegação em si merece maior atenção nas próximas competições. Apesar de pouca,
a experiência que tenho em eventos internacionais só confirma a ideia de que
são muito mais agradáveis os mapas que nos permitem sair com o mínimo de
arranhões, que nos permitam escolher entre várias rotas possíveis e com pontos
de ataque em um raio menor que 100m. Particularmente, afirmo que não pratico
Corrida de Orientação na expectativa de ser obrigado a atravessar muitos
trechos 408 (aquele verde quase escuro, cuja velocidade de deslocamento é ate 60%
menor que a de um terreno aberto).
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Fonte: International Specifications for Orienteering Maps, in: orienteering.org. |
Não há dúvidas, entretanto, que o grau de dificuldade apresentado
pelo terreno e pelos percursos traçados “separou os homens das crianças”. Vejam
abaixo meus momentos “criança” ;-).
Como de praxe, apontarei os detalhes (em sua maioria, os
erros cometidos) que julgo trazerem mais aprendizado para nós. O programa
utilizado é o QuickRoute e os arquivos do GPS eu obtenho a partir do uso dos
dispositivos Igotu ou Suunto. A metodologia é simples: responder às perguntas
“o que planejei?”, “o que fiz?”, e “o que deveria ter feito?”.
Minha meta, como já comentei em análises anteriores, é
percorrer um mapa num pace (tempo em
minutos para percorrer um quilômetro) de 7’/km. E a distância real percorrida
deve ser de, no máximo, 20% acima da distância da linha vermelha.
Estatisticamente, tenho observado que um competidor (excetuando os de Elite)
que atinja essas metas conseguirá completar o percurso dentre os primeiros
colocados.
Neste Percurso Longo, a distância da linha vermelha foi de
5,8 km. Portanto, meu limite a percorrer foi de 7km. Essa distância num pace de
7’ deveria ser completada em, no máximo, 49’. Lindo no papel! Mas quando você
pega uma sinalética de percurso longo e lê que a distância da linha vermelha é
pequena (normalmente um percurso longo de CamBOr para a H35A supera os 7,5km),
já deve imaginar que nem tudo serão flores.
A primeira imagem é o mapa geral da prova:
Abaixo o quadro com as informações de cada trecho percorrido, sendo sublinhados em vermelho aqueles cujo desvio poderia ter sido menor, considerando os aspectos de terreno, leitura de mapa, técnicas de orientação e capacidade física. Para entender melhor, para alcançar o ponto 7, por exemplo, percorri mais que o dobro da distância em linha reta a partir do ponto 6 (diferença de 103,3%).
E estas são minhas escolhas. Notem que grande parte das minhas
rotas está graficamente representada na cor vermelha. Isso significa que foram percorridas numa velocidade
muito baixa. No meu caso, percorri 8.150m em 1h46’. Um pace aproximado de 13’/km.
Rota da partida ao ponto 1:
O que planejei: após o triângulo, continuar seguindo o
aceiro, atravessar o riacho pela trilha e, a partir dali, azimutar para o
ponto.
O que fiz: segui conforme o planejado.
O que deveria ter feito: na figura vocês podem notar as
opções disponíveis para alcance do prisma. Notem que na minha rota escolhida eu
desci até o riacho e depois iniciei uma forte subida em direção ao ponto.
Entretanto, me pareceu a opção mais veloz naquele momento. O orientista deve
observar que um trecho que incorra em forte desgaste físico logo no início da
prova aumenta a probabilidade de erros na leitura do mapa e na escolha das
melhores rotas. Portanto, a opção mais adequada seria a trilha à direita do
triângulo, passando pelo lago. Assim, o desgaste físico seria menor, já que
seriam menos curvas de nível para subir, e a rota seria mais limpa e
sensivelmente menor.
Rota do ponto 5 para o ponto 6:
O que planejei: seguir para a cerca, utilizando-a como
corrimão até o aceiro da linha de alta tensão. Dali, seguir contando a
distância em velocidade. Diminuir a velocidade ao chegar nas proximidades da
trilha à esquerda. Dali, efetuar um deslocamento lento até encontrar a valeta,
a qual seria o ponto de ataque.
O que fiz: segui conforme o planejado. Ocorre que o aceiro
da linha aérea estava impraticável. Várias árvores cortadas em toda sua
extensão tornaram o deslocamento extremamente lento. Passei a me deslocar
mesclando a borda da vegetação e o aceiro. Foram percorridos 150m a mais que a
distancia da linha vermelha, em pouco mais de 8’.
O que deveria ter feito: numa leitura mais atenta, teria
observado que o mapeador demarcou o aceiro em rachurado. Uma opção mais curta
seria chegar até a cerca e seguir pela sua esquerda, atravessar os barrancos e
atacar o ponto por baixo, conforme a seta na imagem. Ocorre que a opção por
atravessar os barrancos me colocaria em risco, além de ter que atravessar uma
vegetação que, pelo visto nos deslocamentos até então, estaria tão ou mais
difícil que o apresentado pela simbologia do mapa. Entram, portanto, questões
relativas ao entendimento do mapeador e à confiança do atleta quanto à
simbologia do mapa.
Rota do ponto 6 para o ponto 7:
O que planejei: descer e atravessar o riacho, tendo como
barreira de segurança a cerca. Em azimute, seguir para a área próxima ao ponto
observando a vegetação mais fechada, a qual serviria para definir o ponto de
ataque.
O que fiz: segui conforme o planejado, embora numa
progressão muito lenta devido à condição real da vegetação. O ponto de ataque
passou a ser a formação em “V” da vegetação. Na primeira tentativa o ponto não
foi encontrado, o que me fez retornar para a borda da vegetação e iniciar novo
ataque, só que mais à esquerda. Novamente não obtive êxito, saindo da vegetação
mais densa e atacando o ponto desta vez a partir de um cupinzeiro. Foram
aproximadamente 180m e 6’ gastos além do necessário caso o primeiro ataque
obtivesse êxito.
O que deveria ter feito: sair do ponto 6 em direção à trilha
indistinta, usando como corrimão a valeta à esquerda deste ponto. Seguir para a
região próxima ao ponto 7 desviando da vegetação de progressão mais lenta
(rachurado). Atacar o ponto a partir do cupinzeiro no bordo da vegetação mais
densa.
Rota do ponto 12 para o ponto 13:
O que planejei: seguir em azimute para o ponto 13 contando a
distância. Diminuir a velocidade nas proximidades do ponto e atacar numa
orientação mais fina a partir de uma das referências percebidas (cupinzeiro ou
árvore de destaque).
O que fiz: parti em azimute, mas é provável que a fadiga
tenha falado mais alto, pois o ataque foi realizado muito antes da distância
ideal. Ao perceber que havia errado o ataque, retornei ao bordo da vegetação e
utilizei as árvores de destaque para corrigir o erro e atacar o ponto.
O que deveria ter feito: deveria ter incluído no
planejamento inicial a árvore de destaque com branco como um primeiro ponto de
checagem. Ela seria a referência para garantir a correta contagem da distância.
Também o ponto de ataque deveria ser definido de início, para evitar que o
desgaste físico tornasse mais complicada a decisão.
Neste erro foram gastos pouco mais de 3’ em uma distância
aproximada de 140m.
Rota do ponto 13 para o ponto 14:
O que planejei: seguir em azimute usando a moita da direita,
próxima à linha de alta tensão. Atravessar a linha de alta tensão e utilizar a
árvore de destaque com branco como ponto de checagem e decisão para o ataque.
O que fiz: segui conforme planejado até a moita. A partir
dali o planejamento foi abandonado e passei a procurar por um local de fácil
entrada na vegetação mais densa.
O que deveria ter feito: a saída do ponto deveria ser mais
próxima à linha vermelha, usando como ponto de checagem a árvore de destaque
com branco. A partir dali, melhor seria ainda manter a rota próxima à linha
vermelha e atacar o ponto a partir da árvore de destaque no bordo da vegetação,
cuja forma em “L” também serviria como ponto de checagem. A valeta próxima ao
ponto garantiria a direção correta.
Esta rota é um ótimo exemplo de como a fadiga pode
interferir no planejamento e nas decisões. Aparentemente, era uma rota fácil,
mas que quase colocou toda a prova em risco. Vale observar, ainda, que o desvio
de mais de 40% me custou pouco mais de 130m além do necessário para atingir o
ponto. Outro detalhe a se notar é que a primeira parte da rota foi em boa
velocidade. Já a segunda parte, a partir da linha de alta tensão, foi em
velocidade baixa (rota em vermelho). Isso confirma a confusão mental e a
dificuldade de decisão.
Rota do ponto 16 para o ponto 17:
O que planejei: sair do ponto 16 em direção à estrada.
Seguir pela estrada até a bifurcação próxima ao ponto de água e, utilizando o
formado da vegetação em “U”, definir o ponto de ataque e buscar o prisma em
baixa velocidade.
O que fiz: ao sair do ponto 16, segui por um aceiro e passei
da entrada da estrada. Ocorre que a decisão foi equivocada e a vegetação da
nova rota só me permitiu voltar para a estrada após atravessar o riacho.
Retornei ao planejamento inicial, chegando à bifurcação e iniciando a
aproximação ao ponto 17.
O que deveria ter feito: seguir conforme o planejado.
Notem que compliquei
em demasiado uma rota que seria limpa e segura. Ao perceber o erro, é provável
que retornar alguns metros ainda assim seria convertido em ganho de tempo e
menor distância percorrida.
Rota do ponto 17 para o ponto 18:
O que planejei: sair do ponto pela direita, buscando a linha
vermelha imediatamente após deixar a vegetação mais densa. Utilizar como
referência o poste de alta tensão demarcado.
O que fiz: saí do ponto com dificuldade de progressão. Para
ter certeza de onde eu realmente estava, segui pela direita até a pequena área
branca. Efetuei a correção da rota a partir dali, procurando a parte de transposição
mais fácil próxima à linha de alta tensão.
O que deveria ter feito: a melhor opção seria a rota mais
próxima à linha vermelha. Inclusive por ser de fácil visualização tanto a
árvore de destaque como o poste de alta tensão.
Uma outra opção seria sair do ponto 17 pela esquerda,
atacando o ponto pela própria linha de alta tensão.
E aí, leitor, o que achou dessa análise de rotas? Se você participou desta etapa, teve dificuldades em "vencer" o terreno? Considera que a simbologia do mapa permitiu uma correta decodificação da vegetação?
Não deixe de emitir sua opinião. Ela será de grande valia para todos os colegas que, assim como você, estão lendo esta análise.
Boas rotas \o/
orientistaemrota